FAMÍLIA SAPORETTI

Monday, November 13, 2006

24- Mamãe e Sua Infância Solitária

Américo Saporetti Filho

Mamãe já crescidinha não saía da casa do pai Emílio na praia, e lá passou a conviver com os meio-irmãos Beatriz, Toni, Reinaldo, Emma e Emilédio. Tia Beatriz não aceitava aquela ligação do pai com a mulher de nível tão mais baixo e via mamãe com indiferença e quase com desprezo.
Tio Toni, padrinho de batismo da Neneti, gostava dela com o coração tamanho de um bonde e foi sempre e sempre será o eterno protetor de mamãe nesta terra em que, por ser filha bastarda, ela tanto sofreu em humilhações. Foi ele quem induziu vovô a apressar o reconhecimento da filha Ginette e que conseguiu que este assunto transcorresse o mais rápido possível. Graças a ele mamãe passou a assinar 'Garavini' em 1938, oito meses antes do seu casamento, com 17 anos.

Reinaldo deixou Ponte Nova cedo, como um cigano, e não me recordo de referências às suas opiniões sobre o assunto. Mas a contar pelas aparências e por contatos com ele e sua mulher Rosinha, não considerava mamãe como sua irmã. Sei que Reinaldo gostava de vestir-se na moda, era lançador de moda masculina em Ponte Nova, com seus belos ternos de linho com calça boca de sino e paletó jaquetão, e tinha paixão pelos carros, baratinhas na época.Tio Emilédio sempre foi um sensível coração de manteiga, e também volúvel. Vinha e voltava. Deve ter amado mamãe muito, como deve tê-la querido mal algumas vezes. Tia Emma disse-me que era obrigada (fez questão de dar este ênfase "obrigada") a fazer um vestido para mamãe todo ano no aniversário dela, por imposição do pai, e por isso nunca vai se esquecer da data: 11 de setembro. Esta obrigação deve ter vestido minha mãezinha de forma inadequada durante os seus aniversários infantis. Tia Emma foi incapaz de mandar uma saudação ou dar um abraço em mamãe depois que acabou a obrigação.

Pelo padrinho Toni e pela irmã Zefina e pelo pai Emílio, mamãe não saía da casa dos Garavini. Gostava também da ordem do banheiro limpinho, e não deixava de ficar extasiada ouvindo e vendo, com seus olhos de criança brilhando, o pai dançar com a irmã nas tardes de domingo e nas festas da família, com vinho, queijo e macarronada. Mas também notava a indiferença dos outros e sentia falta de companhia, e quase empre ficava isolada em seu canto. Não sabia adivinhar os porques. Por que sua mãezinha nunca ia à casa do pai, e tinha sempre uma desculpa para não acompanhá-la com Zefina ou com o pai, quando este a apanhava e levava.

Crescendo entendeu que o ambiente era hostil a ela, e à sua mãe, e se retraiu. Mas se retraiu tanto que passou a não ir mais à casa do pai, para não encontrar os irmãos e se aborrecer. Aos seis anos e pouquinho, mamãe foi matriculada no grupo e passou pelo Bê, A, BA da dona Rosalina Teles, e aprendeu a ler e a fazer contas, e no quarto ano pela mão de dona Sinhá Drummond, completou os estudos que a maioria das mulheres tinha direito, e a partir daí dedicou-se a aprender a costurar, que o casamento não demoraria, e toda moça prendada deveria saber enfrentar o dia a dia de uma casa e seus afazeres, com bastante desenvoltura e desembaraço.

Aos onze anos de idade, quando recebeu o diploma do primário, mamãe já era uma moça feita, de corpo perfeito, alta, magra, escultural, de cabelos castanhos, olhos penetrantes, rosto redondo e largo, e uma imensa vontade de viver o mundo, apesar de toda a opressão da realidade que a atormentava. Não conseguiria o seu intento de imediato. Primeiro teve que criar uma família numerosa para poder usufruir o que, naqueles tempos de juventude, parecia estar tão perto e ao alcance das mãos. Mamãe vive hoje a alegria da velhice. Não sei se é o que ela queria do mundo.

Em paralelo, papai vencia alguns obstáculos e por vezes deve ter topado com aquela menina bonita, que estava vez por outra na casa da sua cunhada Beatriz, casda com o mano Eduardo.

Iremos para lá agora...

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